sábado, 9 de agosto de 2008

Para entender o referendo boliviano de amanhã


O referendo de amanhã na Bolívia necessita de algumas explicações para os brasileiros compreenderem o que se passa (e os riscos políticos). Tentarei resumir alguns pontos essenciais:
1) A Bolívia é um país dividido: 62% da população se identificam como nativos, e a maior parte vive nas terras altas do oeste; os outros quase 40% se consideram brancos, são descendentes de europeus, que vivem principalmente nas terras baixas do leste. A elite social do país é branca ou mestiça e se opõe frontalmente a Evo Morales, um índio Aymara;
2) A história da Bolívia é marcada por conflitos políticos permanentes. Durante a Guerra do Pacífico (1879-83), perdeu seu litoral e seus campos de nitrato para o Chile. A Guerra do Chaco com o Paraguay (1932-35) resultou despertou os segmentos pobres e excluídos, a maioridade indígena. Em seguida, o país foi tomado por uma sucessão de golpes militares. O governo do coronel Germán Busch Becerra (1937-39) reconheceu legalmente as comunidades indígenas e aprovou uma nova Constituição que incluía leis trabalhistas. Em 1952 um novo golpe, de cunho nacionalista (que os historiadores denominam de revolução), instaurou o sufrágio universal, eliminando a exigência de alfabetização e de propriedades para ser eleitor, além de implementar uma ampla reforma agrária;
3) Evo Morales, liderança dos anos 90, teria como marca um passo a frente da afirmação da maioria étnica do país, o que gera conflitos latentes com a minoria branca. As duas nações indígenas mais importantes são a quíchua e a aymara, seguidas por outras dezenas de etnias menores espalhadas por todo o país. Em 2006, Morales nacionalizou a indústria de hidrocarbonetos e deu início a um programa de reforma agrária. Foi o que precisava para provocar a reação do segmento mais abastado da Bolívia, em especial, do departamento de Santa Cruz, uma espécie de governo estadual (leste da Bolívia) e dos departamentos próximos. O principal objetivo foi garantir a soberania (e não mera autonomia como se divulga) dos governos regionais para controlar as reservas de petróleo e gás natural que são significantes;
4) No dia 4 de maio deste ano, o departamento de Santa Cruz organizou um referendo histórico sobre autonomia regional. Mais de 80% do eleitorado de Santa Cruz votou pela maior autonomia e maior controle sobre os recursos da região. Morales desconsiderou o referendo e decidiu convocar o referendo de amanhã, quando o país vai às urnas para definir se ele e os governadores devem permanecer no cargo.

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