domingo, 12 de setembro de 2010

Analfabetismo funcional no Brasil

A professora Onaide Schwartz Correa de Mendonça, coordenadora do curso de pedagogia da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Presidente Prudente (SP), afirmou recentemente que o alto índice de analfabetismo funcional no Brasil detectado pela Pnad 2009 é resultado de problemas no início da escolarização. E foi além. Disse que "se o aluno souber ler e escrever a aquisição dos demais conteúdos será uma consequência". A primeira afirmação é questionável, mas a segunda é completamente equivocada. Mais uma questão técnica educacional que vem sendo banalizada em nosso país.
Em primeiro lugar, existem duas fortes correntes em nosso país que divergem em relação ao processo de alfabetização. Uma delas, que teve no Brasil Paulo Freire como expoente, sustenta que uma pessoa aprende a ler quando relaciona o signo (a letra, o desenho da escrita) com o significado. Quando esta situação ocorre, a pessoa lê (decodifica) e interpreta, ao mesmo tempo. Há, contudo, uma outra corrente que sugere que alfabetização é uma técnica, um aprendizado técnico que não se relaciona com a interpretação. Para eles, alfabetização se distingue de letramento(interpretação e uso social da leitura e escrita). Para o primeiro grupo, não há distinção entre uma coisa e outra. Pois bem: se houve um treinamento técnico para uma pessoa ler sem a exigência da interpretação, a formação intelectual terá sido feita pela metade. Se aproxima de uma técnica de associação (quase um reflexo condicionado) mas não o uso com autonomia da linguagem. Neste caso, a primeira afirmação da professora Onaide teria sentido desde que ela concorde com a teoria freireana (a alfabetização global, não fônica).
Mas o problema é mais profundo quando resume o início do letramento à leitura e escrita (imagino que tenha se limitado à língua portuguesa). Estudos neurológicos como os coordenados por Howard Gardner (Harvard) indicam que temos sete a dez sistemas de inteligência (de tomada de decisões) que são relativamente independentes: inteligência linguística, matemática, intepressoal, intrapessoal, espacial, musical, físico cinestésica, entre outras. Ora, eu posso aprender a ler e não necessariamente desenvolver as outras inteligências. Aí, Onaide simplifica em demasia o problema (que é dos mais complexos). E não há hierarquia, ou seja, não se aprende ler como primeiro ato da aprendizagem e desenvolvimento da inteligência, para depois aprender outro nível. Esta noção de pré-requisito é muito disseminada no país e acaba ganhando ares de certeza técnica. Felizmente (ou infelizmente) a mente humana é muito mais complexa do que a vã esperança de alguns sugere.
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