sábado, 25 de setembro de 2010

A desidratação da oposição ao lulismo


Agora foi a vez de FHC admitir a vitória de Dilma. Em entrevista ao jornal britânico "Financial Times", o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso admitiu a possibilidade de Dilma Rousseff (PT) ser eleita presidente.
O que me preocupa não é necessariamente a derrota eleitoral da oposição. O que me preocupa é a desitratação de toda e qualquer oposição ao lulismo, incluindo várias facções do PT, das esquerdas, das lideranças populares do país. Um fenômeno híbrido porque não é exatamente populismo ou totalitarismo. Todo populismo desconsidera as instituições de representação. Prefere falar diretamente às massas. Lula gosta de falar diretamente, mas fortalece e negocia com sindicatos, partidos, ongs, igrejas. Não se trata, também, de um tipo de totalismo à la Chávez. Lula não mobiliza a população para intimidar a oposição. Ao contrário, desmobiliza qualquer iniciativa de ação de rua, de conflito. Está mais para um estilo neo-getulista, mas também não é exatamente uma cópia.
O lulismo é original neste ponto. Um amálgama do pragmatismo sindical, com perfil carismático e vanguardismo de esquerda, somado à uma forte crença no pacto social pelo desenvolvimento do mercado interno e indústria nacional. Não é exatamente estatizante, mas é orientador dos investimentos e fortalece as empresas estatais que considera estratégicas, com destaque para bancos estatais e área de energia. Mas não agiu assim em relação à telefonia móvel.
Acertou ponteiros com o grande empresariado, com a maioria dos partidos políticos, fará uma ampla maioria no Congresso Nacional e nos governos estaduais. Qual o espaço que terá qualquer oposição? Temo por uma espécie de personalismo político que se firme a partir de um bloco de poder avassalador. Não será chavismo, nem peronismo, nem castrismo. Terá "notas" de cada um, mas será mais: será o lulismo.

7 comentários:

BLOGUEIANDO disse...

Caro Rudá,

Acompanho com muita atenção suas análises e concordo em parte com elas. Porém percebo em suas análises certa frieza talvés magoa em relação ao Lula e até mesmo, em relação ao PT, que vc ajudou a fundar. O Brasil hoje tem um lider carismático, amado pelo povo e desprezado pelas elites. Partilho da seguinte premissa: Ruim com Lula...Pior sem ele. A liderança exercida por Lula junto aos menos favorecidos contempla um projeto que acredito e defendo. Agora, entre o Lula e Aécio quem possui mais compromisso com os pobres, excluídos e a transformação social? Qual liderança faz melhor ao povo sofrido desse país? Será que o modelo de gestão adotado em Minas é o melhor para o país ? PSDB ou PT ? qual é pior ou melhor?

Natale disse...

O Fhc enterrou, de vez, o Serra.
A cada fala deste sociólogo é um desastre, sempre a dor de cotovelo do Lula e a depreciação do Serra.
Admite, descaradamente, a vitória da candidata governista, é o fim não só do Serra, como do Psdb.
Lamentável.
Do que seja o Psdb, pode-se dizer: Se cercar vira hospício, se cobrir vira circo...

Rudá Ricci disse...

Sandro,
Não existe mágoa em política. Ao menos quem entra no jogo para valer. Porque quem joga e não fica na arquibancada sabe que pode perder ou ganhar. A questão é que o lulismo pode ser tudo, menos petismo. Respeito sua premissa, mas eu a considero extremamente pobre. Entre outros motivos, porque parece acreditar em marmanjos salvadores da pátria. Quando fundamos o PT, desejávamos extirpar este tipo de raciocínio meio infantilizado. Tentávamos lutar contra a idolatria e falávamos na organização coletiva. Também não construiria, pelos mesmos motivos, o contrário da sua frase. O que desejo é um país com controle social e governos efetivamente governados pelo cidadão e não por salvadores. Sou coerente (ou tento ser). E não fico ao lado do poderoso do momento. Fico com meus princípios democráticos.

Adair Carvalhais Júnior disse...

Não é muito cedo para falar de lulismo ? Como conceituar algo ainda tão incipiente ? Pelo que "não é" ?

Rudá Ricci disse...

Adair,
Leia meu livro que acabo de publicar pela Contraponto. Ali justifico o conceito. Aliás, trabalhado amplamente pelos cientistas políticos brasileiros, Cito André Singer e Luis Werneck Vianna, entre outros. Trata-se de um fenômeno político dos mais significativos que foi se forjando ao longo das últimas três décadas. Obviamente que há uma diferença metodológica entre historiadores e sociólogos. A sociologia nasceu para explicar fenômenos presentes. Não esperamos décadas e não acreditamos em distanciamento e neutralidade analítica.

Claudinha disse...

Rudá,
estranho teu comentário em relação à desidratação da oposição. Não será o Lula que construirá esta oposição. A oposição precisará construir-se por si só com propostas e projeto político. Ela está se esfarelando e não é à toa, nem por culpa do Lula.
Quanto ao fato de Lula não mobilizar a população para intimidar seus adversários, talvez, isso não seja tão original, quanto se pensa. Quem sabe, ele não mobiliza o povo, pq ele sabe que o povo, na hora H, roi a corda? Eu, pelo menos, não tenho ilusão sobre o apoio popular ao governo Lula, no sentido de um identidade ideológica. O que existe é um apoio oportunista, de uma população que vota num governo que conseguiu melhorar suas condições. E que está muito longe de entender, que tal qualidade de vida, dada a sua despolitização, trata-se de um projeto político. Basta o primeiro aventureiro aparecer com a balela do manter o que está bom e mudar o que está ruim e levar a eleição pra casa.
Quanto ao suposto totalitarismo do Chávez: não existe governo mais testado nas urnas, do que o de Hugo Chávez. E o que aconteceu nas últimas eleições? Na hora do povo ajudar nas profundas reformas do estado, o que aconteceu: ficou sem a maioria necessária. Se os governos de esquerda necessitam do povo para levarem seus projetos adiante, esses governos tb precisam entender, que o povo é um ente eminentemente conservador. Que só em raríssimos momentos da História é capaz de uma virada de mesa.

Eugênio

Rudá Ricci disse...

Eugênio,
Por partes:
1) O problema é quando Lula estimula, a partir de benefícios governamentais, a transferência de parlamentares da oposição para a base aliada. Também é problema quando reduz o espírito crítcio das centrais sindicais a partir de verbas públicas. E, assim por diante. Faz parte do jogo político, mas me parece uma aliança das mais artificiais, sob o manto de farta distruição de recursos públicos advindos dos impostos indiretos, ou seja, dos pobres. O que me preocupa é a intenção de diminuir ao extremo o espaço de qualquer oposição;
2) A não mobilização tem a ver com a crítica que o lulismo faz à participação popular e controle social. O lulismo tutela, não abre espaço político;
3) Urna e voto de maioria não tem relação tão direta com garantias democráticas. Há um belo livro escrito por Luciano Canfora a respeito. E o caso da ascensão de Hitler é clássico. Portanto, teste de urna não elimina a possibilidade de totalitarismo. Chávez não tem cultura democrática. Ele bebe nas águas do militarismo;
4) Me preocupa a sua dicotomia entre esquerda e conservadorismo das massas. A saída seria, afinal, o centralismo e cinismo político? O vanguardismo? Ou a crença democrática, no jogo de vitórias e perdas como naturais? Os impulsos autoritários e totalitários tentam eliminar qualquer possibilidade de derrota. Mas quem crê na democracia respeita a derrota. O vanguardismo já deu sua parca contribuição na virada do século XIX para o XX. Acho que já chega.