segunda-feira, 30 de abril de 2012

A herança da ditadura militar

Recebi duas perguntas muito inteligentes de uma estudante de jornalismo que está elaborando seu trabalho de conclusão de curso. Achei tão interessantes que resolvi socializar aqui no blog (incluindo minhas respostas, o que é cabotino, mas ficaria estranho se só socializasse as perguntas). Agradeço à Carla Fernandez pelas perguntas:

1) A priori, o que eu gostaria de entender mais sobre o regime militar é qual  foi a herança deixada pela ditadura militar para a sociedade?
R: A literatura especializada afirma que não houve democratização do regime autoritário para o processo seguinte, mas "liberalização". Esta é a tese de Leonel Itaussu (USP). Houve um acordo de cúpula, de acerto com o regime militar, de liberalização de direitos com certa lentidão. Não por outro motivo, o fiel da balança, do lado civil, foi Tancredo Neves, que já havia assumido este papel quando da renúncia de Jânio Quadros (ele negociou com João Goulart a adoção do parlamentarismo, em nome dos militares que ameaçavam com um golpe, impedindo Goulart de assumir a Presidência da República). Portanto, foi o setor mais conservador da representação civil, escolhido a dedo pelo regime militar, que negociou a tal democratização do país.
Ora, o que ocorre é que este processo é absolutamente distinto da democratização da Espanha, avaliada como exemplo mundial, a partir do Pacto de Moncloa. 
Qual a consequência imediata desta situação? A tutela do Estado. A sociedade civil não se fez representar na construção de uma nova institucionalidade pública. Assim, os acordos de cúpula continuaram persistindo. Esta é a lógica que fundou o governo Sarney, Collor, FHC e Lula. Esta é a principal herança.

2) Pode-se dizer também que o atual estado de apatia por parte da imprensa é  reflexo dessa possível herança?
R: A grande imprensa se tornou uma força quase partidária. É uma força política. Negocia nos bastidores da política. A pequena imprensa, local ou regional, também. Não são independentes, mas agem de maneira comercial. Há exceções, mas raridade. Portanto, não há passividade. Pelo contrário. 

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